segunda-feira, 27 de maio de 2013

A rápida substituição de edifícios - Will Eisner




 Prefácio

"Depois de muitos anos vivendo numa cidade grande, gradualmente desenvolvemos um senso de assombro. Isto porque muito do que acontece ao nosso redor é inexplicável e, ao mesmo tempo, mágico. Enquanto eu crescia em meio à turbulência da vida urbana, era preciso apenas um estado de alerta superficial para enfrentar o ritmo das mudanças e experiências que se desenrolavam. Havia pouco tempo para questionar a rápida substituição de pessoas e edifícios.
Tais coisas deviam ser aceitas como normais. À medida que fui envelhecendo e acumulando recordações, passei a me sensibilizar mais e mais com o desaparecimento de pessoas e referências urbanas. Para mim, eram especialmente perturbadoras as inexplicáveis demolições de prédios. Eu sentia como se, de alguma forma, eles tivessem alma.
Agora, estou certo de que essas estruturas marcadas por risos e manchadas por lágrimas são mais do que edifícios inertes. É impossível pensar que, ao fazerem parte da vida, não tenham absorvido as radiações provenientes da interação humana.
E eu me pergunto sobre o que resta depois que um prédio é demolido."
Will Eisner, Florida, 1987.

 Ao ler a obra do inesquecível Will Eisner, O edifício, além de sua emocionante história, refleti durante muito tempo sobre o seu prefácio. Os edifícios são testemunhas do cotidiano, são cenários e atores da História. São abrigos para ricos (confortáveis fortalezas) e para os pobres são espaços de trabalho ou lazer, abrigam doentes, escondem revolucionários, são destruídos em tempos de guerras. Automaticamente, ao ler as palavras de Eisner, trouxe a sua reflexão à cidade de Fortaleza. Se observarmos a história de nossa cidade, percebemos que há certa ânsia incontrolável pelo novo, pelo que vem de fora. E os que mais sofrem são os prédios. Claro, estou apenas colocando um ponto, pois esse fato é assunto de bastante discussão e reflexão. A cada ano, uma nobre testemunha de nossa história sucumbe pelos maquinários barulhentos, devoradores. Assim, a nossa memória se despedaça e se fragmenta. Agora, não sei qual a identidade arquitetônica desta cidade. Se eu morar dez anos fora, ao voltar, as referências que eu tinha, talvez já estejam esfaceladas,  carregadas pelo vento. Um canto onde sentava e lia um bom livro, agora pode ser uma avenida. Uma loja de ontem, hoje pode ser um estacionamento. É triste uma cidade sem memória. É triste uma cidade que não respeita a si mesma.